(imagem retirada da internet)
Eu estava sentada no mesmo banco do mesmo jardim que visitava todos os dias mas aquele dia era especial, era diferente! Não estava calor, aliás, o frio quase que congelava os ossos e as poucas pessoas que por ali se passeavam usavam casaco por cima de casaco.
Ela estava sentada no banco atrás do meu... As nossas costas quase se tocavam. Era costume ela estar por ali aquela hora do dia, tal como eu, e embora não soubéssemos nada uma da outra, já éramos "velhas conhecidas".
A hora do almoço acabou e eu só conseguia pensar na tarde atarefada que me esperava mas foi então que ouvi as vozes que soavam no banco onde ela estava.
- Estava a ver que não vinhas! - disse ela.
- Desculpa! Sabes como são os dias nesta semana de Natal; o trânsito está caótico.
Por cima do ombro vi aquele rapaz que se sentara ao lado dela, eu não o conhecia; ela sempre se sentara sozinha, tal como eu.
- Não faz mal, Ricardo. Temos a tarde por nossa conta.
Ele chamava-se Ricardo.
- Queres ir para outro sítio? Está frio aqui... Muito frio!
- Não, Ricardo! Gosto disto aqui! É calmo, é tranquilo, está frio mas mesmo assim é bom estar aqui. Sabes o que isto me faz lembrar? Os nossos passeios naquele lago perto da casa dos teus pais, lembras-te?
- Oh Mónica, como poderia não me lembrar?
Ela chamava-se Mónica.
- Começas tu ou começo eu? - perguntou ele.
O silêncio que se instalou prometeu uma daquelas conversas que ninguém mais deve escutar... Mas eu estava ali, já estava ali antes de ele chegar e, sinceramente, eles não pareciam importarem-se com isso.
- Sabes, Ricardo, eu pensei bem... Vi e revi cada um dia destes últimos meses e cheguei à conclusão de que é normal!
- Normal?
- Sim! A Carla anda sempre a falar na crise dos sete anos... Eu acho que nós tivemos a crise dos sete meses.
Ele agitou-se! Por cima do ombro vi que ela aproveitou para se chegar mais para ele.
- Não sei se te serve de muito vires com esse tipo de desculpas, agora. Foste tu que me puseste fora de casa, não foste, Mónica?
- Sim, fui! E estou muito arrependida!
- Fazes ideia daquilo por que passei? A humilhação que foi e continua a ser? Estou inocente, percebes? Inocente!
A voz dele estava calma! Calma como aquele dia de Inverno!
- Eu sei, Ricardo! Desculpa! Sabes como eu sou; sempre actuo sem pensar nas consequências e aquilo que se passou foi demasiado mau...
- Não! Não foi demasiado mau! Tu é que tiraste as conclusões que quiseste tirar e nem sequer me deste a oportunidade de explicar! Mas sabes que mais? Acho que não mereces qualquer explicação!
- E que tal veres pelos meus olhos? Põe-te no meu lugar! Só desta vez, põe-te no meu lugar! Peguei no teu telemóvel e vi uma mensagem daquelas... O que querias que eu pensasse?
- Pensasses o que quisesses mas poderias ter-me dado o benefício na dúvida, não? Não quiseste ouvir-me... Nem sequer quiseste saber se aquilo era mesmo verdade! Leste uma mensagem que fora enviada para mim por engano...
- Eu sei disso! Sei disso, agora!
- Sim, agora sabes disso mas não quiseste saber na altura! Começaste logo com as tuas coisas, os teus palpites, as tuas desconfianças!
- Eu sou assim!
- E que culpa tenho eu? Ah?! Diz-me! Que culpa tenho eu?
- Desculpa!
- Só isso não chega!
- Foi muita coisa junta! A Carla diz...
- A Carla isto... A Carla aquilo... Quando é que deixas de ouvir a Carla? Lá por o marido dela ser o sacana que é, não quer dizer que os outros também o sejam!
- Desculpa, Cadinho!
"Cadinho"? Deve ser o diminutivo de Ricardo!
Eu tinha tantos planos para aquela tarde! O Natal estava à porta e tudo aquilo que o envolve estava por fazer... Queria ir embora, juro! Mas fiquei presa ao banco, fiquei presa aqueles dois seres que estavam mesmo atrás de mim...
O silêncio prolongou-se.
Uma rajada de vento fez algumas folhas levitarem e, por momentos, pareceu-me que o vento cantava uma daquelas canções que nunca ninguém antes ouviu.
As pessoas agarravam os gorros, os chapéus, o que quer que fosse que servia para aquecer a cabeça, e apertavam mais os seus casacos.
O vento soprava, soprava e as nuvens dançavam no céu azul que se estendiam por cima das árvores... O dia irradiava a luz de mil sóis.
- Não sei como fazes isto! - exclamou Ricardo.
- O quê?
- Depois de tudo o que me fizeste e de tudo aquilo que eu sei que me irás fazer; continuo a amar-te como amava naquela noite em que me ajoelhei à tua frente e te pedi em casamento!
Os suspiros dela diziam-me que as lágrimas estavam a ser contidas... Mas não por muito mais tempo.
- Vou mudar, Ricardo! Prometo!
- Mudar? Mas eu gosto tanto de ti assim, como és!
Ela deixou que as lágrimas caíssem e, sempre por cima do ombro e como quem não quer a coisa, vi os braços dela a apertarem o pescoço dele com uma força delicada.
- Nasce aqui um novo capítulo? - Ricardo perguntou.
- Nasce uma nova história!
Ele acolheu-a nos seus braços.
- Mónica! Mónica! Dás cabo de mim!
- Preciso de ti inteiro... Até porque vais ser pai!
Levantei-me com um grande sorriso nos lábios e deixei-os com a paz daquela novidade que ela revelara.
Caminhei rumo à minha vida mas não mais pensei nas tarefas que tão bem tinha planeado... Em vez disso peguei no telemóvel e liguei para aquele número que sempre ocupava a lista de chamadas.
- Estou! - ele atendeu.
- Amor, sou eu! Tenho tantas saudades tuas...
nota: texto de ficção criado por mim para a "Fábrica de Histórias".
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